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Coordenação em Incidentes de Múltiplas Vítimas

Constitui um dos cenários mais desafiadores para os sistemas de resposta em emergências, pois exige simultaneamente rapidez, racionalida...

Constitui um dos cenários mais desafiadores para os sistemas de resposta em emergências, pois exige simultaneamente rapidez, racionalidade e integração de múltiplos atores em um ambiente de incerteza extrema. Diferentemente de ocorrências isoladas, os IMVs rompem a lógica linear do atendimento tradicional, demandando uma abordagem sistêmica, onde aspectos de gestão estratégica, tática e operacional se entrelaçam em tempo real.

Em primeiro plano, a coordenação precisa transcender a simples soma de recursos humanos e materiais. Ela se estrutura a partir de protocolos preestabelecidos como o Sistema de Comando em Incidentes (SCI/ICS) que oferecem uma matriz hierárquica flexível e escalável, permitindo que a autoridade seja clara, mas ao mesmo tempo adaptável à dinâmica do evento. Tal arcabouço busca evitar redundâncias, lacunas ou conflitos entre equipes de diferentes origens institucionais (bombeiros, SAMU, Defesa Civil, polícias, hospitais, entre outros).

A centralidade dessa coordenação repousa na tomada de decisão sob pressão, onde o tempo é variável crítica e o “custo do erro” se multiplica exponencialmente pela quantidade de vítimas. O estabelecimento de áreas funcionais (zona quente, morna e fria), a comunicação unificada e a gestão da informação em tempo real configuram elementos indispensáveis. A ausência de um fluxo comunicacional integrado tende a gerar duplicidade de esforços, retardando triagem, estabilização e evacuação.

Outro ponto de complexidade reside na priorização de vítimas. O processo de triagem, por si só, é mais do que uma categorização clínica: é um ato de gestão de recursos escassos, muitas vezes atravessado por dilemas éticos, já que a vida de alguns é priorizada em detrimento de outros, não pela gravidade isolada, mas pela probabilidade de benefício frente ao recurso disponível. Essa dimensão ético-operacional só pode ser bem administrada se houver coordenação clara e legitimada entre os agentes de saúde e de resgate.

Além disso, a coordenação deve contemplar a logística ampliada, ou seja, a capacidade de mobilizar, alocar e redistribuir recursos (ambulâncias, equipamentos de suporte avançado, insumos, leitos hospitalares). Aqui, a integração interinstitucional e intersetorial ganha relevo, pois a resposta não se restringe ao local do incidente, mas se estende à rede hospitalar e aos centros de comando regionais.


Por fim, cabe destacar a necessidade de resiliência organizacional. A coordenação eficaz em IMV não emerge espontaneamente no caos; ela é fruto de planejamento prévio, treinamentos conjuntos, exercícios simulados e interoperabilidade entre agências. Quanto mais internalizados estiverem os fluxos de comando e comunicação antes da crise, mais rápida e harmoniosa será a convergência operacional quando o evento real se materializar.

A coordenação em incidentes de múltiplas vítimas é uma arquitetura complexa de liderança distribuída, protocolos técnicos e gestão integrada, cujo êxito depende da conjugação entre preparo prévio, clareza decisória e flexibilidade adaptativa diante da imprevisibilidade do evento.

Arquitetura de Comando e Governança Operacional

Em um cenário de múltiplas vítimas, o caos inicial tende a gerar dispersão de esforços e sobreposição de funções. A coordenação só é possível se houver uma arquitetura de comando previamente definida, capaz de centralizar a autoridade, mas ao mesmo tempo descentralizar a execução. O Sistema de Comando em Incidentes (SCI/ICS) se mostra essencial, pois permite uma hierarquia escalável, que pode se expandir conforme a magnitude do evento. O Comando Unificado é necessário quando várias instituições têm competência sobre a cena (ex.: bombeiros, polícia e saúde). Dentro desse arcabouço, cada seção atua como engrenagem interdependente, garantindo fluidez na resposta.

Itens práticos:
- Implantação do SCI/ICS em todos os níveis.
- Comando Unificado quando múltiplas jurisdições se sobrepõem.
- Estrutura mínima: Comando, Operações, Planejamento, Logística e Finanças/Administração.
- Oficiais especializados: Inteligência, Informação Pública, Segurança e Ligação Interinstitucional.

Gestão Espacial e Estratificação da Cena

A coordenação eficaz exige um uso inteligente do espaço operacional. A cena precisa ser dividida em zonas de risco e suporte, de modo que as equipes saibam exatamente até onde podem avançar e em qual área devem atuar. Essa delimitação reduz riscos, ordena os fluxos e evita colapsos na movimentação de vítimas e profissionais. Ferramentas modernas como GIS, drones e monitoramento em tempo real podem aprimorar a visão situacional e permitir ajustes contínuos do perímetro de atuação.

Itens práticos:
- Zona Quente: risco imediato, acesso restrito, foco em retirada rápida.
- Zona Morna: ponto de triagem e estabilização clínica inicial.
- Zona Fria: instalação do Posto de Comando Unificado, evacuação e logística.
- Uso de mapas dinâmicos e recursos tecnológicos para atualização da cena.

Processos de Triagem Estratificada

A triagem em incidentes de múltiplas vítimas não é apenas um ato clínico, mas uma estratégia de gestão de escassez. O objetivo é otimizar recursos limitados para salvar o maior número possível de vidas. Protocolos de triagem como START ou SALT permitem categorizar rapidamente as vítimas, mas a triagem não se encerra no ponto de impacto: ela se repete em níveis sucessivos, ganhando complexidade a cada etapa. Essa estratificação é fundamental para reduzir mortalidade e sobrecarga hospitalar.

Itens práticos:
- Triagem Primária: rápida, no local do impacto.
- Triagem Secundária: mais detalhada, em Posto Médico Avançado (PMA).
- Triagem Terciária: redistribuição hospitalar com prioridade cirúrgica e intensiva.
- Protocolos recomendados: START, SALT, CareFlight, Triage Sieve/Sort.

Sistemas de Comunicação e Informação Operacional

A comunicação é o sistema nervoso da resposta emergencial. Em IMVs, a falta de interoperabilidade leva a ruídos, duplicidade de esforços e atraso nas decisões críticas. Um sistema robusto de informação operacional deve integrar rádios, telefonia, satélites e plataformas digitais, criando um Common Operating Picture (COP) ou seja, uma visão situacional única e compartilhada por todas as agências. A presença de um Oficial de Ligação assegura que cada instituição atue dentro de uma linguagem comum.

Itens práticos:
- Comunicação interoperável entre bombeiros, SAMU, polícia, defesa civil e hospitais.
- Centro de Informações Táticas (CIT) no Posto de Comando.
- Oficial de Ligação como ponto de integração entre agências.
- Criação de um COP (quadro situacional único atualizado em tempo real).

Gestão Logística Avançada

A logística é a espinha dorsal do atendimento a múltiplas vítimas. Sem suprimento adequado, a triagem perde eficácia, o atendimento colapsa e a evacuação se torna caótica. A coordenação logística envolve não apenas transporte de vítimas, mas também o fornecimento contínuo de insumos críticos, oxigênio, medicamentos, energia e até alimentação para equipes em campo. A integração com a rede hospitalar regional é indispensável, pois a cena do incidente se prolonga até a estrutura hospitalar.

Itens práticos:
- Cadeias de suprimento emergencial (oxigênio, fluidos, kits de trauma).
- Gestão e rotação de ambulâncias, aeronaves e veículos de apoio.
- Integração com hospitais para monitoramento de leitos e UTIs disponíveis.
- Estabelecimento de corredores sanitários para evacuação segura.

Dimensão Ético-Decisória

A coordenação em IMVs envolve decisões de vida e morte. Nem sempre é possível atender todos, e a lógica de salvar o maior número prevalece sobre o atendimento individualizado. Isso cria um campo de bioética aplicada ao desastre, em que os profissionais precisam agir segundo critérios objetivos, mas dentro de uma legitimidade ética e social. Sem esse respaldo, corre-se o risco de ruptura de confiança e desmoralização da equipe.

Itens práticos:
- Critérios de priorização baseados em probabilidade de sobrevida e custo de recurso.
- Perspectiva do benefício populacional agregado.
- Apoio ético-operacional às equipes diante de dilemas críticos.
- Comunicação clara e transparente sobre critérios utilizados.

Integração Multinível e Rede de Resiliência

Nenhum sistema responde de forma eficaz a IMVs sem planejamento prévio e interoperabilidade. A resposta precisa integrar diferentes níveis: estratégico (autoridades públicas e políticas), tático (comando regional e hospitais) e operacional (equipes em campo). Essa integração só funciona se for testada previamente em treinamentos, simulados e exercícios conjuntos. Após cada evento real, é essencial o processo de After Action Review (AAR), para retroalimentar o sistema e fortalecer a resiliência institucional.

Itens práticos:
- Integração entre níveis estratégico, tático e operacional.
- Planos de contingência intersetoriais.
- Treinamentos conjuntos, simulações de mesa e exercícios de campo.
- After Action Review (AAR) como ferramenta de aprendizagem organizacional.


FONTE DE REFERÊNCIA
CESBOM - CENTRO DE ESTUDOS PARA BOMBEIROS