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Uso de Pranchas Aquáticas e Spineboard

O emprego de equipamentos específicos no resgate aquático e em operações de salvamento envolvendo vítimas com possível comprometimento d...

O emprego de equipamentos específicos no resgate aquático e em operações de salvamento envolvendo vítimas com possível comprometimento da coluna vertebral constitui um dos pilares mais complexos e desafiadores das técnicas de salvamento profissional. Dentro desse contexto, o uso de pranchas aquáticas e spineboards (também conhecidas como pranchas rígidas de imobilização) representa uma convergência entre princípios de biomecânica, hidrodinâmica, segurança operacional e atendimento pré-hospitalar (APH). 

A atuação eficaz do socorrista depende não apenas da posse desses equipamentos, mas de uma compreensão aprofundada sobre suas aplicações, limitações e sobre o comportamento do corpo humano em meio aquático quando submetido a forças externas e à necessidade de estabilização.

A Prancha Aquática como Extensão Tática do Socorrista

Frequentemente utilizada por guarda-vidas e equipes de salvamento costeiro, é um equipamento que vai além da simples função de suporte flutuante. Trata-se de um instrumento de penetração rápida em áreas de difícil acesso aquático, projetado para sustentar o peso da vítima e permitir que o socorrista execute manobras de aproximação, resgate e estabilização sem comprometer sua própria segurança.

Fabricadas em materiais como poliuretano expandido com reforço em fibra de vidro ou polietileno de alta densidade, essas pranchas apresentam elevada capacidade de flutuação, estabilidade direcional e resistência à torção, fatores essenciais para garantir a sustentação simultânea de uma ou mais pessoas em condições de mar agitado. Além disso, a disposição ergonômica das alças laterais permite múltiplos pontos de ancoragem e controle da prancha durante o reboque, otimizando a cinemática do resgate aquático e reduzindo o risco de movimentos bruscos que possam agravar lesões.

O socorrista, ao empregar a prancha aquática, precisa dominar técnicas de aproximação hidrodinâmica, avaliando o sentido das correntes, a direção das ondas e a posição da vítima. A prancha atua como um meio de interface entre o socorrista e o corpo da vítima, servindo tanto para o suporte físico quanto para a estabilização psicológica, pois a vítima sente maior segurança quando apoiada sobre uma superfície firme e controlada. Esse fator psicológico é relevante, já que o pânico em meio aquático pode comprometer seriamente a eficácia da operação.

Spineboard em Operações de Salvamento

Enquanto a prancha aquática desempenha papel preponderante na fase de acesso e retirada da vítima, o spineboard (ou prancha rígida de imobilização) assume protagonismo na fase de imobilização e transporte seguro da vítima até o ambiente seco ou hospitalar. O spineboard é um dispositivo técnico desenvolvido para manter o alinhamento anatômico da coluna vertebral, prevenindo o agravamento de possíveis lesões medulares decorrentes de traumas cervicais, torácicos ou lombares.

Seu design é pensado com base na biomecânica da imobilização espinhal: uma superfície plana, rígida e leve, dotada de aberturas laterais que permitem a fixação de cintos, estabilizadores de cabeça e outros dispositivos complementares. Produzido em materiais como poliuretano injetado ou compostos de fibra de carbono, o spineboard é imune à corrosão e facilmente higienizável, o que o torna adequado ao uso em ambientes aquáticos e de alta umidade.

A transferência da vítima da prancha aquática para o spineboard constitui uma etapa crítica da operação, exigindo sincronização entre os socorristas, controle do eixo corporal e comunicação precisa. Nessa fase, o conceito de “movimento em bloco” é fundamental, a vítima deve ser movimentada como uma unidade sólida, evitando qualquer rotação do tronco em relação à cabeça ou pelve. Para isso, técnicas como o “roll log” (rolamento em tora) e o uso coordenado de imobilizadores cervicais e coxins laterais são aplicados conforme os protocolos de APH.

Além disso, o spineboard é o elo de ligação entre o salvamento e o atendimento médico avançado, uma vez que permite o transporte seguro da vítima em viaturas de resgate, helicópteros ou ambulâncias, sem que haja perda da imobilização inicial. Assim, ele atua como instrumento de continuidade assistencial, preservando a integridade do alinhamento espinhal e garantindo que o socorro prestado no ambiente aquático se integre de forma eficaz ao sistema de saúde emergencial.

Integração Operacional entre Prancha Aquática e Spineboard

O ponto mais sofisticado da operação reside na transição entre o meio líquido e o meio sólido, ou seja, no momento em que a vítima passa da prancha aquática (fase de salvamento e deslocamento) para o spineboard (fase de imobilização e transporte). Este é um processo que requer domínio técnico, sinergia entre os operadores e compreensão do comportamento do corpo na interface água-terra.

Durante essa transição, o socorrista precisa controlar variáveis ambientais como marolas, correntes, vento e inclinação da faixa de areia enquanto mantém o alinhamento axial da vítima. Pequenas falhas de comunicação ou desalinhamentos durante esse processo podem converter uma lesão leve em uma lesão medular irreversível. Por isso, equipes de salvamento em altura e aquático recebem treinamento rigoroso em protocolos de estabilização espinhal e gerenciamento de múltiplos resgatistas, incluindo o uso de palavras-chave padronizadas, comando único e coordenação visual entre os membros da equipe.

Essa integração entre equipamentos não é meramente técnica, mas estrategicamente vital. A prancha aquática assegura o acesso e a sustentação; o spineboard, por sua vez, garante a preservação e o transporte. Em conjunto, formam um sistema de suporte completo ao resgate aquático com suspeita de trauma, no qual a precisão técnica e a eficiência operativa determinam o prognóstico da vítima.

Referências Técnicas e Procedimentos Operacionais Padronizados

Para o emprego correto desses dispositivos, as equipes devem seguir normas e protocolos estabelecidos por instituições de referência nacional e internacional. No Brasil, a SOBRASA (Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático) orienta as práticas de salvamento e resgate em ambientes aquáticos, destacando a importância do uso de equipamentos homologados e da capacitação técnica contínua dos guarda-vidas.

No âmbito da normatização técnica, a ABNT NBR 16877/2020 define parâmetros para equipamentos de salvamento aquático e recomendações sobre resistência, flutuabilidade e manutenção preventiva. Já no contexto do Atendimento Pré-Hospitalar, o Protocolo Nacional de APH (Ministério da Saúde, 2019) e as diretrizes do SAMU 192 reforçam a obrigatoriedade da imobilização espinhal adequada em vítimas com suspeita de trauma, seguindo critérios de avaliação cinemática e exame primário (ABCDE).

Internacionalmente, as normas NFPA 1006 e NFPA 1670, publicadas pela National Fire Protection Association (EUA), estabelecem requisitos mínimos de competência técnica para profissionais envolvidos em resgates aquáticos e técnicos, incluindo o domínio do uso de spineboards e equipamentos flutuantes de resgate. Essas diretrizes enfatizam a importância da análise de risco prévia, do planejamento tático-operacional e da coordenação entre equipes interinstitucionais, especialmente quando há integração entre bombeiros, guarda-vidas e socorristas civis.

Outro aspecto relevante é a padronização dos Procedimentos Operacionais Padrão (POP), que devem contemplar:
- A verificação prévia das condições da prancha aquática e spineboard (integridade estrutural, cintos, flutuabilidade, higienização);
- O uso obrigatório de EPIs como colete salva-vidas, nadadeiras e capacete;
- O posicionamento estratégico da equipe durante o resgate (líder de cena, nadador principal e apoio de superfície);
- O registro pós-operacional, fundamental para avaliação e melhoria contínua dos protocolos.

Esses POPs são vitais para garantir uniformidade de procedimentos e reduzir a margem de erro em operações de alto risco, mantendo o alinhamento com as diretrizes internacionais de segurança e qualidade em salvamento aquático.

Checklist Operacional para o Uso de Pranchas Aquáticas e Spineboard

A padronização dos procedimentos de verificação, operação e pós-resgate é essencial para assegurar a eficácia e a segurança das operações de salvamento. O checklist operacional a seguir tem como objetivo fornecer uma ferramenta prática de apoio ao socorrista, permitindo o cumprimento rigoroso dos protocolos técnicos e a redução de falhas humanas em cenários críticos. Podendo servir como instrumento de padronização, treinamento e controle de qualidade, garantindo que cada etapa desde a preparação até o transporte da vítima seja realizada com precisão e responsabilidade técnica.

Verificação Prévia dos Equipamentos
- Inspecionar integridade da prancha aquática (rachaduras, deformações, perda de flutuabilidade).
- Verificar alças, fitas e pontos de ancoragem.
- Confirmar o estado de higienização e ausência de resíduos que comprometam o manuseio.
- Avaliar o spineboard quanto à rigidez e presença de todos os cintos de fixação.
- Testar os imobilizadores laterais e colar cervical (tamanhos disponíveis).

Preparação do Socorrista e da Equipe
- Utilizar EPIs completos (colete, nadadeiras, capacete, óculos e rádio).
- Designar papéis na equipe: líder de cena, socorrista primário, apoio aquático e equipe de solo.
- Confirmar comunicação padronizada (sinais visuais e verbais).
- Revisar o plano de aproximação e retirada com base nas condições do mar e vento.

Procedimentos na Aproximação e Atendimento da Vítima
- Avaliar visualmente o estado da vítima antes do contato.
- Aproximar-se por trás, garantindo segurança do socorrista.
- Apoiar a vítima sobre a prancha aquática, mantendo alinhamento do tronco e da cabeça.
- Verificar nível de consciência, respiração e pulso.
- Aplicar estabilização manual da cabeça até o uso do colar cervical.

Transição da Prancha Aquática para o Spineboard
- Posicionar o spineboard parcialmente imerso e paralelo à prancha aquática.
- Coordenar o “movimento em bloco” com, no mínimo, três socorristas.
- Transferir a vítima mantendo o alinhamento axial, sem flexão ou rotação do pescoço.
- Fixar cintos torácicos e pélvicos, seguidos da estabilização da cabeça.
- Confirmar estabilidade antes da retirada total da água.

Transporte e Entrega da Vítima
- Realizar transporte horizontal com sustentação uniforme.
- Monitorar sinais vitais e manter via aérea permeável.
- Comunicar à equipe médica as observações sobre o mecanismo de trauma.
- Registrar o horário e as condições do resgate para relatório operacional.

Pós-Operação
- Realizar higienização completa dos equipamentos com água doce e solução antisséptica.
- Registrar uso e condição dos equipamentos em ficha de manutenção.
- Avaliar o desempenho da equipe em reunião de debriefing técnico.

Treinamento Especializado e Padronização Internacional

A evolução tecnológica dos materiais, associada ao avanço dos protocolos internacionais de resgate, tem impulsionado o aprimoramento contínuo das pranchas aquáticas e spineboards. Hoje, muitos modelos incorporam sistemas modulares de flutuação ajustável, mecanismos de fixação magnética e sensores biométricos integrados, ampliando a capacidade de monitoramento da vítima durante o resgate.

Contudo, nenhum avanço técnico substitui o elemento humano do salvamento: o conhecimento, a percepção situacional e o treinamento constante. A eficácia no uso desses equipamentos depende diretamente da padronização dos procedimentos e da capacitação periódica das equipes, garantindo que cada ação desde a entrada no mar até a entrega da vítima ao hospital ocorra dentro de parâmetros técnicos seguros.

Assim, o uso de pranchas aquáticas e spineboards transcende a mera aplicação de equipamentos; representa uma síntese da ciência do salvamento, onde física, fisiologia, psicologia e técnica convergem para preservar o bem mais precioso: a vida humana.


FONTE DE REFERÊNCIA
CESBOM - CENTRO DE ESTUDOS PARA BOMBEIROS